terça-feira, 7 de agosto de 2012

AMOR, O NECTAR DE TODOS OS SENTIDOS.

Alinor Rodrigues

 

        Era uma bela tarde, e o Sol a céu de brigadeiro, assava o lombo do cidadão já á meia idade, que num andar apressado adentrou uma loja mais para dar um refresco do que para comprar alguma coisa. A loja é de artigos variados, como perfumes, vestuário, acessórios para viagem etc.

        Logo se apresentou para atendê-lo uma mulher de porte singular, sua idade e aparência, eu diria ser como as preferidas de Balzac... Com olhos verdes em sua face amendoada o semblante inspirava um oculto sorriso incitando à lembrança de uma Gioconda...

         É a dona da loja; A simpatia no atendimento logicamente é profissional e não pode ser confundido com interesses pessoais. Mas, a cena é entre humanos, e quando acontece aquele olho no olho, uma faísca etérea vinda d´além infinito os atinge em cheio ligando-os num entrelaço que só o coração explica.

        O sorriso oculto se abre radiante como um Sol da manhã...

     - Sim, o que o senhor deseja escolher? A vontade dele veio á ponta da língua: - Você! Mas essa palavra jamais poderia ser dita, então falou-se  dos artigos da loja, sobre a tarde quente, e naquele calor, as pernas dele tremiam como o andar pelas ruas em noite de geada...

        Ela aproximou-se um pouco mais; foi um súbito místico, os sentidos giraram como o moinho da vida... E ele diz: - Eu já não a vi antes?- Sim, por mais de uma vez, mas você não notou; foram momentos rápidos, porém eu o notei! Ligeiramente ele argumenta: - A recíproca é verdadeira mas o respeito me proíbe comentar; foi em dias recentes, mas o tempo é implacável, os anos passam e nos volteios dos dias sempre acabo chegando tarde... A frase é dita em tom melancólico e quase inaudível, observando nela que a roupa em fina seda verde era cúmplice fazendo aqueles  olhos ainda mais esmeralda.

        Ela aproximou-se ainda mais, deu pra sentir sua fragrância, era indescritível, e com um olhar meigo e sereno falou com voz suave: - Tarde? Nunca é tarde, se o tempo é implacável então estamos no momento certo; o tempo é o calendário de Deus e é assim que somos!..

        O papo entre os dois foi se alongando e quando se deram conta passava das dezoito horas, ela teria que cerrar as portas, e assim foi.

Ao se despedirem, a cumplicidade falou mais alto, e não resistiram a separação continuando juntos, um jantar a luz de velas selou a união.

        Mais tarde ele pensava: Ó Deus, porque só agora fui encontrá-la? Nunca amei tanto! Ela é o raio de luz rasgando minha escuridão...

        Acho que sempre tateei às cegas pelos caminhos em busca de meu destino, e agora está tudo claro, nunca mais falsearei meus passos; Minhas alegrias eram fugazes como o flutuar das folhas secas ao impulso da brisa no outono; mas hoje sou feliz.

        Porém, no instante dessas divagações, uma voz soa num estrondo vindo das  profundezas de sua consciência: - Ledo engano caro vivente!.. Desde o nascimento recebeste a Luz, a Vida, e se assim não fosse, jamais aqui estarias; Em toda sua existência vens recebendo de Deus a Aura que o ilumina e fortalece, e amor, o néctar de todos os sentidos!

        Esse "olhar para dentro" o leva a uma descoberta: Acho que realmente nunca cavalguei às cegas pelas estradas deste meu pequeno mundo; digo pequeno porque sempre consegui vencer todas as etapas sendo eu tão miúdo dentro da vastidade.

        Vivi intensamente meus dias e minhas noites, trabalhei, fiz mil coisas, amigos, até filhos eu fiz, e o amor que senti ainda sinto cada vez mais porque o amor é como a raiz de boa cepa, que com o passar do tempo mais se aprofunda pra ser eterno...

        Mas, como o tempo é implacável, o amor conhecido ao fugir do calor do Sol naquela tarde de outono é agora um pergaminho que trago como relíquia enriquecendo o conteúdo das lembranças contidas na alma...

 

 

SONS DO PASSADO

Alinor Rodrigues

 

        Com o controle na mão postei-me sobre o sofá em frente a TV e fui passando aleatoriamente pelos canais quando deparei com uma apresentadora entrevistando a consagrada atriz Bibi Ferreira. Foi o que mais interessante encontrei entre todos os canais de TV visitados naquele momento.

        Perguntas bem colocadas vindas da entrevistadora á artista, eram respondidas com requintada inteligência.

        Bibi, com seus noventa anos de idade é e sempre será a Diva brasileira como atriz, cantora, pianista, dedicando toda sua vida com incrível talento, finésse e generosidade ao mundo das artes cênicas, e ainda com a credencial de ser filha do ícone da dramaturgia e do cinema brasileiro, o inesquecível Procópio Ferreira.

        O assunto como não podia deixar de ser versava sobre suas experiências e apresentações pelos palcos do mundo.

A certa altura da entrevista a conversa foi tornando-se informal, muitos risos e considerações; Num entremeio a apresentadora falando sobre a vida da entrevistada fez uma pergunta com respeito a vida da atriz: - Qual o acontecimento, ou alguma coisa trazida do passado que te alegra ou entristece? A resposta foi seca: - Passado? Eu não tenho passado! Eu tenho o presente!..

        Diante da importância de quem proferiu tal afirmativa, confesso que me senti meio fora de contesto, e com uma indagação em mente: será que ouvi bem; será que ainda estou com o raciocínio perfeito? Estarei sem saber num mundo que não é mais meu?.. Concordo quanto a expressão: Tenho o presente; porque em sã consciência coloco que o futuro não existe, e o presente é perene como Deus...

        Quanto a minha pessoa, por uma questão de auto-respeito, considero ter um passado; dele vem o conteúdo de minha alma, e tudo o que sou...

        Nascido nos confins do mundo, onde não havia estrada, nem energia, ferramentas, livros, escola, meios de comunicação, tecnologia como hoje existe, onde a natureza era a máquina do homem; fui o guri que lentamente passou a entender o Sol, a Lua, correndo e caçando pelas barrancas do Rio São João que de uma margem á outra são apenas 50 metros, pulando sobre as pedras na corredeira ou nadando no trecho de águas mansas; respirando natureza e jovialidade inocente.

        Mas o tempo amigo, implacável e generoso, enriquece a memória legando experiências que jamais são esquecidas, ajudando no rumo pelos caminhos da vida...

        Por aí que o guri conheceu as contendas humanas, a fé em Deus, a nefasta incredulidade d´outros, a verdade e a falsidade, o amor e o ódio...

        O conhecido no passado ensinou-o a optar pelo lado bom; o da Luz com muito amor e Deus no meio. Falar das benesses dessa opção seria redundância, todo pensante sabe. Lembrar do passado, das comédias e tragédias é tornar o presente mais sábio.

        Sem graça é quem não tem do que chorar de saudade.

        Acompanham-me as lembranças dos amores, dos triunfos e fracassos que soam em meus ouvidos como uma sonata ao longe... Essa é  fortuna cá em meu presente, que enriquece meu sentir por toda gente... O som da passarada por campinas  florestas e vales, sol escaldante e suaves luares trazendo na alma Deus, e o canto das águas...

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

ESQUISITO ‘CORRETOR’ DE IMÓVEIS

Com a fundação da cidade de Maringá, e o loteamento da área urbana, fez-se necessário a ação de pessoas para proceder a venda dos lotes que aqui chamamos de Datas. Muitos dos quais ainda aqui vivem com orgulho de ter participado dessa saga para a evolução de uma cidade que nem esperavam fosse se tornar tão linda e importante no cenário do Estado e do País.

Com tantos anos no exercício de corretor de imóveis, e construção civil, tive o prazer de conhecer e me tornar amigo de mitos colegas.

      Ser corretor de imóveis não é ser apenas um intermediário à venda de um objeto qualquer; Trata-se da transferência de um bem imóvel do legítimo proprietário para o comprador, por meio de um Contrato de Venda e Compra, elaborado em Cartório e posteriormente registrado na Circunscrição Imobiliária.

     A responsabilidade do corretor é atrelada Cível e Criminalmente, e jamais poderá ele usar de artifício ou truculência referente ao recebimento de comissão pelos serviços prestados, estabelecido conforme a Lei. Por isso digo que me orgulho dos colegas que conheci e com quem mantenho perene amizade. Quem assim não o foi, não é meu amigo!.. Seria impossível lembrar o nome de todos apenas numa página, mas vou citar alguns dos mais antigos: Lembro por exemplo do Gilson Escada, do Zênite, o Helio Moreira, do Jorge Fregadolli que aliás foi um dos primeiros, e tantos outros; Cláudio Sandri, Elias, o Iraci Mochi, Ataídes Tambani, o Pedro Granado, Arthur Rempel, o Alaôr Theodoro, o Fernando, o Itamar e o Antonio Ribeiro. Também algumas mulheres, a Eleni, a Rosely e Irene Messias. Aos demais colegas peço desculpas por não nominá-los, mas tenham a certeza: Quando olho em meu coração, sinto todos aqui dentro... Gosto dessa profissão porque ela é dinâmica e variada, o corretor tem que estar sempre atento a tudo o que acontece na cidade e, se foi correto, eficiente e leal em todos os negócios que participou, causando contentamento para ambas as partes, certamente conseguirá credibilidade para negócios futuros.

Acho que cada um de nós sempre têm algum acontecimento ás vezes engraçado, outras nem tanto para contar: Certa vez estava eu fechando uma venda no valor de duzentos mil reais a ser pago nas seguintes condições: Cinqüenta mil reais no ato, e o restante mediante a escritura definitiva assinada pelo vendedor e o comprador e devidamente registrada em Cartório. O comprador todo prosa pegou o talão de cheques e começou preenche-lo, de repente, como quem levou um susto, o cara parou de escrever, pensou por alguns segundos e em seguida pegou rapidamente os papeis de sobre a mesa já assinados, proposta de compra, avaliações, negativa de impostos, etc. e com a voz meio engasgada: - Me desculpem, não posso fazer isso agora!... – Saiu correndo, foi pro carro e sumiu.

      O proprietário boquiaberto como eu, só me olhou e: - Belo comprador você arranjou não é? – E ali ficamos um olhando para a cara do outro, como um bom par de asnos.

        Outra passagem: Foi quando levei um interessado na compra de uma fazenda em Mato Grosso. Na época havia por lá mais picaretas que gafanhotos. Chegando ao hotel, o próprio recepcionista já foi perguntando todo malicioso: - Vieram ver umas fazendas? Meu cliente respondeu displicente: - Mais ou menos. Nessa hora percebi se tratar de um "informante" dos picaretas; Ora, na manhã seguinte, antes de servirem o café, bateu à porta um sujeito digamos assim, muito esquisito; Usando bota com um protetor de aço na ponta, cano alto quase até o joelho por cima da calça jeans, chapéu velho de aba larga todo torto, jaqueta de couro sobre camisa de brim. Notei um volume por baixo da jaqueta; disfarçadamente vi tratar-se de uma arma de grosso calibre, já que era deeeeesse tamanho!...

        Sem a menor cerimônia estendeu a mão se apresentando: - Prazer, meu nome é Zé de Sosa; vieram compra fazenda? – Sim, mas já tenho uma oferta que me interessou; hoje vou correr as divisas com o meu corretor. O cara olhou franzindo a testa me encarando de cima a baixo retrucou com a maior calma: Á bão. Mas toda aquela aparência de calma não é de boa paz não senhor, esses falsos caboclos são espertos e perigosos, e ele não se conformou em perder um comprador em potencial e na maior cara-de-pau perguntou na lata:- Qual é a fazenda? – Quando meu comprador falou, na hora o indivíduo berrou: - Essa eu conheço! É ruim, não tem boas águas, a terra é fraca, ta muito mal cuidada, sabe que lá já teve até "chaminé"? – isso quer dizer posseiro. – Agora eu tenho uma que ta nas minhas mão, pra venda, e me encarando olho no olho, com cara de mau advertiu: E eu to sozinho no negócio! O senhor não pode deixar de ver, eu levo oceis. Meu cliente concordou em ir, acho que mais para por panos quentes na situação do que comprar, e lá fomos nós ver a tal fazenda. Depois de vermos tudo ele me olhou e afastando-se do tal Zé falou baixinho: Isto aqui é uma merda. Depois deu umas desculpas dizendo ter de pensar bem antes e que mais tarde faria contato inclusive pegando o endereço.

         Lá era assim, quando se via um tipo desses, com uma capanga cheia de papeis sujos e surrados presa pelo sovaco, com certeza, ali estava um picareta. Os corretores daqui até diziam em tom de brincadeira: Quem tiver que levar um comprador àqueles lugares, terá que leva-lo dentro de um saco!...

        Por fim, consegui realizar o negócio, mas nunca mais voltei lá...

ESPERANÇA

       Nunca desesperes. Em Deus confia.

       Inda que tarde, chegará um dia, o teu quinhão. De benesses como ouro, brilhantes multicores, de alegrias muitos dias, do mundo mais amores, em pura e cristalinas águas banharás teu coração.

       Que nunca o açoite do desespero o aflija; Se alguém ao acaso o feriu de morte em seus brios e amor próprio; e chorar mais não podes porque lágrimas já não tens, mesmo assim perdoa: Eis que dos bons essa é a virtude!

       Por mais que passe o tempo e das jornadas já a fadiga se apresente, vai em frente.

       Esquece os maus que por teus caminhos ficaram, após trair tua confiança, boa fé e amizade e eis que tua esperança e tua fé são verdadeiras, força pra alcançá-lo não terão,

Porque Deus é tua fortaleza; E de espinhos serão deles os caminhos e por espadas em chamas de aniquilados os farão.

       Se triste estás porque só de injustiças o mundo te oferece, a Deus invoca, que Ele a boas e belas veredas o guiará; Em isso acontecendo, terás da vida um Novo Despertar...

O amor verás, e também ele sentirás por todos quem no passado odiastes. Uma luz em todo teu ser brilhará, explodindo em tal intensidade como a do Primeiro Dia!

       Serás feliz então; dores não mais sofrerá teu corpo nem a alma, e em alegria e paz viverás teu tempo. Por aí entenderás que por inexplicáveis meios, o Poder do Pai sempre presente esteve a inspirá-lo, pois do humano esse é o destino.

 

A JANELA

     Ao despertar numa manhã de primavera, o cara ainda na cama fala á mulher que acaba de  deixar os lençóis: Amor, abra a janela! Não no tom de uma ordem, mas falado com carinho e suavidade porque sabe que a voz  do homem ao acordar pela manhã quase sempre soa desagradável. Ela concorda e em seguida ouve-se o barulho das roldanas deslizando pelos trilhos maltratados, parecendo um trem descarrilando.

       Um clarão invade o quarto vindo o Sol beijar o leito ainda quente do contato frenético iniciado no escurinho da véspera... O vivente espreguiça-se ensaiando levantar-se... – Oh janela que deixaste entrar toda essa luz, tanto calor, inspirando toda alegria, a vontade e o amor, através de ti que mais verei por este belo dia? – Além dos pombos arrulhando na cumieira, e a mágica flauta do sabiá gorgeando ali no alto do cedro, se quiseres verás o Mundo;  Sou única, mas apenas do teu quarto! Deus oferta a ti incontáveis janelas; há uma em cada sentido de teu ser, e todas estão abertas no rumo das circunstancias da vida; através delas poderás ver o que há de bom, e de ruim; e um dos lados terás de abraçar, e a escolha será só sua. Não esqueça de que o lado ruim por sua perversidade sempre apresenta-se atraente, convidativo, fascinante, porém, armado de longas unhas afiadas como a dos felinos; se este for seu lado preferido tenha certo que, mais cedo ou mais tarde será este um bumerangue, e por ele serás ferido. Lógicamente falo por suposição, és inteligente e bom cristão, só por isso já escolherás a janela do lado bom; Ésta e muito ampla revelando a luz mais resplandecente que se possa imaginar. Através dela poderás ver a terra unir-se ao infinito; o caminho é longo e até lá chegares passarás por venturas e desventuras inimagináveis, mas terás de seguir na esteira do Sol pois a vida não pára já que somos eternos... Mas se Deus é o cajado de tua alma, sua estrada será venturosa.

       Amarás por todo trecho; serás platéia de grandes espetáculos pelos palcos da vida; Homens e mulheres na luta pelo pão de cada dia, a solidão de um camponês lavrando a terra, chaminés de fábricas que lançam fumaça  lambendo o Céu; o burburinho das cidades com o povo se acotovelando  em busca de seu espaço, prédios erigindo e torres implodindo, aviões aterrisando vindos d´além  do horizonte, outros decolando como indo ás estrelas, navios singrando os mares levando mercadorias, outros carregados de turistas em cruzeiro de laser,  industrias com suas máquinas barulhentas transformando coisas. Além do trabalho ao embalo da vida; Templos religiosos encimados pelos campanários e o badalar dos sinos anunciando a hora do Ângelus; na cidade florida lindas mulheres passando à sombra do arvoredo onde teu coração é arrebatado a cada dez passos. Só paz, beleza e muito amor. Concluirás que só por isso vale a vida; as janelas do lado ruim estão fora de teu mundo. Mas para que assim permaneças da primeira advertência não esqueças! Tendo Deus como alicerce jamais penderás pro lado errado; Só verás o bom e farás o bem. Bem, o dia passou e pouco viste de tudo o que existe; é demais para um dia, um mês ou vários anos, só neste diálogo, ou num livro de setecentas páginas, que seria para poucos leitores pois a maioria não gosta de ler e nem tem tempo pra isso; Hoje tudo é virtual, instantâneo acontecendo apenas num simples clic.

       A noite chegou e se faz tarde; tiveste um bom jantar?...Amanhã serei aberta a mostrar-te um novo dia, ao brilho do Sol ou á zoada da chuva sobre o telhado com o arrulho do pombo e a flauta encantada do sabiá fazendo a festa.

       Podes passar a tramela!... Durma bem.

 

 

segunda-feira, 11 de julho de 2011

A Loura Dos Olhos de Safira e o Punhal

Constantemente ela aparecia pela manhã vindo sabe-se lá de onde.
Quando passava próximo ao Alfeu, ele sentia uma espécie de calafrio, o coração acelerava, e as pernas tremiam.
Como a via seguidamente deduziu que ela residia próximo dali.
Quem seria? Qual o motivo que a levava a andar tão apressada, e sempre sozinha em meio a multidão no torvelinho do cotidiano? Em poucos dias já o coração de Alfeu a via como uma ovelhinha perdida num grande rebanho sem pastoreio. Inspirado, numa certa manhã criou coragem e decidiu: vou desvendar esse enigma! A aproximação foi meio atabalhoada, mas, ele conseguiu. Acompanhou-a por alguns passos e arriscou um olá!.. ela respondeu sem titubeio e com um leve sorriso. Com o coração em turbulência de tanta alegria o projeto de conquistador continuou: Apesar de que ninguém está aqui para nos apresentar, meu nome é Alfeu! A resposta foi: Já sei! – E como que você sabe? – Ora, sou uma mulher, e por motivos óbvios tenho que ter cuidado, há dias observo como me olhas e também já sei quem você é; Educado e cavalheiro! – Obrigado... Sempre a vejo sozinha, seria indelicado perguntar se vives com seus pais ou alguém? Sem muita convicção ela apenas foi dizendo que era uma longa historia e que isso não era assunto para aquele momento. A esperança dele foi imediata; - Quer dizer então que voltaremos a conversar? – Voltaremos sim, agora tenho de ir, não posso me atrasar para o trabalho. E onde fica? Perguntou ele. – É logo ali naquele prédio cinza e branco, naquela multinacional! – E qual é sua função? – Sou intérprete! – Hã; e como é seu nome? – Eu sou Vi, deu um tchau e sumiu prédio à dentro.
O encontro do dia seguinte foi bem mais descontraído, mas a confiança ainda não era total; pairava no ar um ponto de interrogação... Alfeu nada tinha a esconder como nada a revelar. Um cara simples, acabára apenas o segundo grau nos estudos e ainda indeciso quanto a faculdade; classe média, bom trabalho, alguns bens e qualidade de vida razoável. Muito boa aparência, mas nunca ligou pra isso devido sua timidez. Alfeu é tímido, mas não é bobo. Numa tarde de sexta feira resolveu esperá-la no final do expediente, pegou o carro e saiu com esse propósito. Estacionou um pouco distante do prédio porque em frente não havia vaga. Esperou por alguns minutos quando uma figura apareceu descendo as escadarias que dão acesso á calçada; andando despreocupada Vi nem percebeu que Alfeu a esperava, e foi nesse momento que ele descobriu o porquê do ímpeto em encontrá-la: Linda, elegante, corpo perfeito, pele morena clara e aveludada, cabelos louros e longos esvoaçando ao vento da tarde. Apesar da aglomeração de gente pela calçada ele não via mais ninguém, foi o momento mais longo e estranho de sua vida. Cada passo, cada movimento feito por ela, era gravado em sua retina para nunca mais esquecer. Ao avistar Alfeu que a esperava, correu a abraçá-lo com os olhos brilhando de alegria.
Foi aí que ele notou um detalhe que ainda não tinha percebido: aqueles olhos azuis, azuis como a safira, adornando aquele rosto lindo que assim ficou com o sorriso ainda mais insinuante.
Vamos! Vou levá-la para casa. – Ótimo, obrigada. Entrou no carro dando-lhe um longo beijo.
Durante o percurso passando em frente a um prédio disse ele: aqui é que eu moro! Ela emendou: - Eu sei; décimo andar... Alfeu estava tão inebriado que nem notou para esse detalhe, apenas continuou; e agora qual é o caminho? Ela foi indicando: - Siga em frente na quarta esquina vire á direita; chegando ao local indicado após virar á direita; agora na segunda esquina temos que virar á esquerda é no numero 883. Parando no tal endereço, conversaram por alguns minutos e ela despedindo-se e agradeceu com um beijo. Alfeu queria continuar o diálogo, mas veio a desculpa dizendo-se cansada e ansiosa por um bom banho. Mesmo assim ele a acompanhou até o saguão. Voltou para o carro meio sem graça, pois viu cair por terra seu intento em saber mais a respeito da intrigante mulher que tanto o fascinou e nem sequer convido-o a entrar.
Como em todas as circunstâncias da vida o melhor conselho é a paciência, resolveu dar um tempo ás suas angustias. A estratégia deu certo. Dias depois ela é que sentia a falta de seu paquera...  Por onde andaria? O que teria acontecido? Com certeza já estaria com outra, pensava.  E pra sua surpresa começou a sentir ciúmes, mas ponderou: Isso não pode estar acontecendo comigo. Logo eu que já estou com calos nos pés de tanto chutar marmanjo!
Alfeu procurava vê-la de longe, evitando ser visto, chegou a perceber que sua musa demonstrava  certa tristeza, andava de cabeça baixa, não mais com aqueles passos firmes e elegantes de tempos atrás. Na semana seguinte, temendo maiores sofrimentos para ambos porque a paciência também tem limites decidiu dar um fim no problema...
De repente, lá está Vi, sozinha, parada no farol. Alfeu deixa o carro estacionado e sai correndo para encontrá-la, nem consegue pensar no que dizer, se encontram num abraço frenético, ele apenas imagina: que linda você está; tenho ciúme desse vento beijando teu corpo, teu rosto, acariciando teus cabelos, como eu te quero!.. O encontro na rua foi um escândalo que mais não é necessário dizer.
Com muito carinho se abraçam e ele falando em sussurros: Meu amor, minha vida. Ela então replica: - Tua vida? Então você já sabe o meu nome completo? Ele apenas pergunta; - Por quê? – Porque esse é o meu nome, Vida! Vi é como sou chamada por minhas amigas. – Alfeu pensa: - Agora teu nome tem duplo sentido: Vida é a minha Vida!..
O namoro continua, a intimidade cada vez mais profunda. Alfeu já freqüenta a casa de sua Vi com liberdade, apesar disso, ela, pelo fato de morar sozinha é uma garota precavida, detalhe que seu namorado ignora.
Certa vez, ela distraidamente abriu a bolsa na presença de Alfeu que sem querer percebeu haver no interior da mesma um objeto que devido a seu formato não parecia com batom, pente, lixa de unha etc. Éra um lindo estojinho de couro fino e delgado. Curioso mas educado não perguntou de que se tratava. Ela, que é esperta, sentiu a curiosidade, fechou imediatamente a bolsa e comentou brincando: É um chocolate. Ele fingiu entender mas, sabia, não era chocolate...

Dias depois, Alfeu foi buscá-la para irem ao cinema, quando chegou, ela ainda se arrumava e no momento, trocava de bolsa passando o conteúdo de uma para outra; Aí foi que ele viu; O chocolate, era um belo punhal, daqueles cuja lâmina é embutida no cabo. Levou um susto mas fingiu nada ter visto. Depois vêm as dúvidas; Será que conheço verdadeiramente essa mulher, tão meiga, inteligente, e tão querida? Que motivo teria para conduzir uma arma? E logo lhe vem à lembrança um crime ainda não esclarecido acontecido tempos atrás na cidade: Um homem foi assassinado a faca, e dizem que por uma amante misteriosa, dado que a vítima era pessoa influente na sociedade.
No começo é apenas receio, mas a dúvida vai piorando, vai ficando mais forte até se transformar em pânico. Pra completar, Vida tem um belo exemplar de gato angorá, preto, chamado Jack! Aí ele associa o nome do bichano com Jack o estripador.
Num pesadelo, ela o atacou, ele viu aquela lâmina reluzente penetrar seu coração, o sangue jorrava... A situação se tornou insuportável, até que ele decidiu deixá-la. Com o coração dilacerado, começa afastar-se de sua amada. Ela assustada quer saber do que se trata, mas não consegue. Ele não tem argumentos convincentes; Apenas que ainda não está preparado para o compromisso, precisa de tempo. Não dá certo; Receios, incertezas, despedidas, amor, lágrimas rolam de ambos os lados; É o fim! Alfeu fica só, remoendo suas saudades.
Vida, moça vivida e inteligente, sabe que viver é seguir em frente...
Como antes pertencera ao elenco do teatro amador de sua faculdade resolve voltar representando a peça na qual usa o punhal que tanto apavorou o seu amado e que  nunca soube ser o vilão do fim de seu romance... O punhal, era de plástico!...

terça-feira, 31 de maio de 2011

SAUDADE DO SOL

 

 

  SAUDADE DO SOL

Alinor Rodrigues

                    Era madrugada, quatro horas mais ou menos, as nuvens vagando sob a luz do luar

         Formavam sombras que passavam como fantasmas em ondas desaparecendo velozmente

         Na imensidão.

Vindo da boemia já com os olhos ardendo, fixo o olhar para um vulto e logo ali está; sentada ao relento com o rosto descansando sobre os joelhos e as mãos cruzadas ao baixo ventre uma mulher. A folhagem da arvore sob a qual se encontrava a protegia, era seu manto, mas o gelado vento sul, era um açoite... Meus sapatos de solado espanhol com salto de couro batido faziam meu andar estridente, ao pisar na calçada, cada passo dado era um estalo. Percebendo minha aproximação, lentamente vai levantando o rosto com um olhar sonolento, vago, e com total desinteresse; ao pescoço uma fina corrente dourada e um crucifixo como pingente.

Aproximei-me dirigindo um olá, tudo bem? Ela resolveu se por em pé pretendendo recompor suas vestes; Tinha quase minha altura, tez clara, cabelos longos e bem tratados, corpo de porte esbelto. Ao ver tudo aquilo fingindo não prestar atenção pensei: Que desperdício!... Achei aquela situação um tanto surrealista... Mas em fim ouvi sua voz: - Por que você quer saber? – E eu surpreso; saber o que? – ela respondeu: Você não me falou, olá tudo bem? – Ah, é que vi você aí, sozinha, pensei que talvez não tivesse se sentindo bem... Você já pensou no perigo que corre ao perambular sozinha pelas ruas no meio da noite? – Perigo nada; tenho andado sol ita por muitas noites; aparece alguém de vez em quando como você apareceu agora, mas nem sempre dou sorte... – Que quer dizer com isso? – Nada que possa valer a pena, apenas ando meio desanimada, foi bom você aparecer; eu já estava com saudades do amanhecer! – Como poderia sentir saudades de algo que ainda não aconteceu? – Senti sim; quando se está só, ao sabor do sereno, a gente torce para que amanheça logo, daí, cada minuto é interminável, e a noite fica eterna... – Eu entendo você! – Que bom você é do bem, por acaso és padre, pastor ou algo assim? – Nada disso! Um religioso não estaria aqui á essas horas! – Engana-se, já vi alguns circulando na noite a procura de drogados e outros infelizes, e não raras vezes eles conseguem. Mas esses abnegados também correm risco. Numa noite dessas assisti uma cena que no teatro seria hilária, mas infelizmente foi no palco da vida; A altas horas, circulava um sujeito pela rua, solitário, mal trajado, barba por fazer e com cara de maus bofes. O padre aproximou-se do indivíduo creio que pensando: Vou recolher essa ovelha desgarrada para o meu rebanho! Ao chegar junto, sua "ovelha" era um ladrão que em cima foi logo exibindo uma adaga que reluzia ao clarão da iluminação pública. Foi uma ação rápida e ali estava o padre, sem o relógio, a carteira e seu flash a baterias. E o ladrão simplesmente sumiu... A cidade dormia, continuamos andando e falando baixo, só o estalido dos meus sapatos quebrava o silêncio, até que encontramos um bar com a porta aberta á meia folha, entramos nos acomodando ao redor de uma mesinha tosca e pedimos um drink; A luz do ambiente me possibilitou ver melhor a figura de minha inesperada e recente companhia: Era bonita, e de inteligência nada ordinária!

O tempo vai passando e ela torcendo para que logo o dia se fizesse claro; A lua já havia desaparecido...

Aos poucos vai começando o barulho; É o bocejo do despertar da cidade; Mais alguns momentos e o clarão raiado explode no horizonte, é o Sol por um momento pintando as nuvens de vermelho e iluminando esta face da terra como o faz desde os milênios que nem se tem notícias...

Olhamos contemplativos para o espetáculo quando fiz meu comentário:

Isso tudo é Deus! Só Ele faz; Por amor a tudo o que Ele criou, inclusive nós...

Ela concordou, foi aí que perguntei: Quer que eu a leve para casa? – apesar de nem sequer saber seu endereço – ela não aceitou e quando eu insisti, ela argumentou: - Não precisa se preocupar; com Ele sou dona do meu destino. – Saiu balançando os quadris.

Jamais fiquei sabendo seu nome!...