terça-feira, 7 de agosto de 2012

AMOR, O NECTAR DE TODOS OS SENTIDOS.

Alinor Rodrigues

 

        Era uma bela tarde, e o Sol a céu de brigadeiro, assava o lombo do cidadão já á meia idade, que num andar apressado adentrou uma loja mais para dar um refresco do que para comprar alguma coisa. A loja é de artigos variados, como perfumes, vestuário, acessórios para viagem etc.

        Logo se apresentou para atendê-lo uma mulher de porte singular, sua idade e aparência, eu diria ser como as preferidas de Balzac... Com olhos verdes em sua face amendoada o semblante inspirava um oculto sorriso incitando à lembrança de uma Gioconda...

         É a dona da loja; A simpatia no atendimento logicamente é profissional e não pode ser confundido com interesses pessoais. Mas, a cena é entre humanos, e quando acontece aquele olho no olho, uma faísca etérea vinda d´além infinito os atinge em cheio ligando-os num entrelaço que só o coração explica.

        O sorriso oculto se abre radiante como um Sol da manhã...

     - Sim, o que o senhor deseja escolher? A vontade dele veio á ponta da língua: - Você! Mas essa palavra jamais poderia ser dita, então falou-se  dos artigos da loja, sobre a tarde quente, e naquele calor, as pernas dele tremiam como o andar pelas ruas em noite de geada...

        Ela aproximou-se um pouco mais; foi um súbito místico, os sentidos giraram como o moinho da vida... E ele diz: - Eu já não a vi antes?- Sim, por mais de uma vez, mas você não notou; foram momentos rápidos, porém eu o notei! Ligeiramente ele argumenta: - A recíproca é verdadeira mas o respeito me proíbe comentar; foi em dias recentes, mas o tempo é implacável, os anos passam e nos volteios dos dias sempre acabo chegando tarde... A frase é dita em tom melancólico e quase inaudível, observando nela que a roupa em fina seda verde era cúmplice fazendo aqueles  olhos ainda mais esmeralda.

        Ela aproximou-se ainda mais, deu pra sentir sua fragrância, era indescritível, e com um olhar meigo e sereno falou com voz suave: - Tarde? Nunca é tarde, se o tempo é implacável então estamos no momento certo; o tempo é o calendário de Deus e é assim que somos!..

        O papo entre os dois foi se alongando e quando se deram conta passava das dezoito horas, ela teria que cerrar as portas, e assim foi.

Ao se despedirem, a cumplicidade falou mais alto, e não resistiram a separação continuando juntos, um jantar a luz de velas selou a união.

        Mais tarde ele pensava: Ó Deus, porque só agora fui encontrá-la? Nunca amei tanto! Ela é o raio de luz rasgando minha escuridão...

        Acho que sempre tateei às cegas pelos caminhos em busca de meu destino, e agora está tudo claro, nunca mais falsearei meus passos; Minhas alegrias eram fugazes como o flutuar das folhas secas ao impulso da brisa no outono; mas hoje sou feliz.

        Porém, no instante dessas divagações, uma voz soa num estrondo vindo das  profundezas de sua consciência: - Ledo engano caro vivente!.. Desde o nascimento recebeste a Luz, a Vida, e se assim não fosse, jamais aqui estarias; Em toda sua existência vens recebendo de Deus a Aura que o ilumina e fortalece, e amor, o néctar de todos os sentidos!

        Esse "olhar para dentro" o leva a uma descoberta: Acho que realmente nunca cavalguei às cegas pelas estradas deste meu pequeno mundo; digo pequeno porque sempre consegui vencer todas as etapas sendo eu tão miúdo dentro da vastidade.

        Vivi intensamente meus dias e minhas noites, trabalhei, fiz mil coisas, amigos, até filhos eu fiz, e o amor que senti ainda sinto cada vez mais porque o amor é como a raiz de boa cepa, que com o passar do tempo mais se aprofunda pra ser eterno...

        Mas, como o tempo é implacável, o amor conhecido ao fugir do calor do Sol naquela tarde de outono é agora um pergaminho que trago como relíquia enriquecendo o conteúdo das lembranças contidas na alma...

 

 

SONS DO PASSADO

Alinor Rodrigues

 

        Com o controle na mão postei-me sobre o sofá em frente a TV e fui passando aleatoriamente pelos canais quando deparei com uma apresentadora entrevistando a consagrada atriz Bibi Ferreira. Foi o que mais interessante encontrei entre todos os canais de TV visitados naquele momento.

        Perguntas bem colocadas vindas da entrevistadora á artista, eram respondidas com requintada inteligência.

        Bibi, com seus noventa anos de idade é e sempre será a Diva brasileira como atriz, cantora, pianista, dedicando toda sua vida com incrível talento, finésse e generosidade ao mundo das artes cênicas, e ainda com a credencial de ser filha do ícone da dramaturgia e do cinema brasileiro, o inesquecível Procópio Ferreira.

        O assunto como não podia deixar de ser versava sobre suas experiências e apresentações pelos palcos do mundo.

A certa altura da entrevista a conversa foi tornando-se informal, muitos risos e considerações; Num entremeio a apresentadora falando sobre a vida da entrevistada fez uma pergunta com respeito a vida da atriz: - Qual o acontecimento, ou alguma coisa trazida do passado que te alegra ou entristece? A resposta foi seca: - Passado? Eu não tenho passado! Eu tenho o presente!..

        Diante da importância de quem proferiu tal afirmativa, confesso que me senti meio fora de contesto, e com uma indagação em mente: será que ouvi bem; será que ainda estou com o raciocínio perfeito? Estarei sem saber num mundo que não é mais meu?.. Concordo quanto a expressão: Tenho o presente; porque em sã consciência coloco que o futuro não existe, e o presente é perene como Deus...

        Quanto a minha pessoa, por uma questão de auto-respeito, considero ter um passado; dele vem o conteúdo de minha alma, e tudo o que sou...

        Nascido nos confins do mundo, onde não havia estrada, nem energia, ferramentas, livros, escola, meios de comunicação, tecnologia como hoje existe, onde a natureza era a máquina do homem; fui o guri que lentamente passou a entender o Sol, a Lua, correndo e caçando pelas barrancas do Rio São João que de uma margem á outra são apenas 50 metros, pulando sobre as pedras na corredeira ou nadando no trecho de águas mansas; respirando natureza e jovialidade inocente.

        Mas o tempo amigo, implacável e generoso, enriquece a memória legando experiências que jamais são esquecidas, ajudando no rumo pelos caminhos da vida...

        Por aí que o guri conheceu as contendas humanas, a fé em Deus, a nefasta incredulidade d´outros, a verdade e a falsidade, o amor e o ódio...

        O conhecido no passado ensinou-o a optar pelo lado bom; o da Luz com muito amor e Deus no meio. Falar das benesses dessa opção seria redundância, todo pensante sabe. Lembrar do passado, das comédias e tragédias é tornar o presente mais sábio.

        Sem graça é quem não tem do que chorar de saudade.

        Acompanham-me as lembranças dos amores, dos triunfos e fracassos que soam em meus ouvidos como uma sonata ao longe... Essa é  fortuna cá em meu presente, que enriquece meu sentir por toda gente... O som da passarada por campinas  florestas e vales, sol escaldante e suaves luares trazendo na alma Deus, e o canto das águas...